Sobre os Tubarões e Raias
Tubarões, raias e quimeras pertencem à classe Chondrichthyes, que é um grupo particular de peixes que apresenta o esqueleto formado por cartilagem. Essa classe é dividida em duas subclasses: Holocephali, representada por quimeras ou peixes-elefante e Elasmobranchii, que compreende os verdadeiros tubarões e raias.
No mundo inteiro são conhecidas cerca de 500 espécies de tubarões e 570 espécies de raias. Desse total, aproximadamente 136 ocorrem na costa brasileira, sendo 81 do primeiro grupo e 55 do segundo. Na costa paranaense já foram registradas 51 espécies de tubarões e 32 de raias, entre organismos costeiros e oceânicos. Esses números podem variar, tanto local quanto mundialmente, devido aos avanços da ciência de classificação, por meio de descoberta e descrição de novas espécies, separação de um grupo em duas ou mais espécies ou até mesmo pela invalidação de outras.
As raias diferem dos tubarões por apresentarem corpo deprimido dorso-ventralmente, fendas branquiais na porção ventral da cabeça, nadadeiras peitorais fundidas à cabeça e nadadeiras caudais bem desenvolvidas ou em forma de chicote. Os tubarões possuem corpos cilíndricos, portanto hidrodinâmicos, aberturas branquiais nas laterais da cabeça, nadadeiras destacadas da cabeça e nadadeiras caudais bem desenvolvidas.
Tubarões e raias estão distribuídos em todos os oceanos, em águas tropicais, subtropicais, temperadas e frias. Podem ocorrer desde regiões costeiras até grandes profundidades, ocupando numerosos ambientes como recifes de coral, estuários e águas oceânicas, desde a superfície até áreas profundas.
Em um primeiro momento podemos imaginar que tubarões e raias ocorrem somente em ambiente marinho ou estuarino, o que não é uma verdade. A ocupação dos ambientes aquáticos por esses peixes é tão vasta que existem diversas espécies de raias que são exclusivas de água doce. Algumas delas são encontradas no Brasil como, por exemplo, as raias dos gêneros Potamotrygon e Plesiotrygon. Também o tubarão-cabeça-chata (Carcharhinus leucas) pode ser observado em ambientes com baixa ou nenhuma salinidade, ou seja, podendo adentrar em grandes sistemas de águas continentais, como a do rio Amazonas.
Apesar do número de tubarões e raias ser relativamente menor que outros grupos de vertebrados, esses animais apresentam uma série de características biológicas complexas. Uma delas é a reprodução altamente especializada, com fertilização interna e produção de um número relativamente baixo de filhotes muito desenvolvidos. Esse modo de reprodução pode ser dividido em oviparidade e viviparidade.
Os elasmobrânquios ovíparos depositam os ovos no substrato e o desenvolvimento embrionário ocorre fora do corpo da mãe. Os embriões ficam dentro de uma cápsula e nutrem-se por meio do vitelo (bolsa vitelínica ligada ao embrião). Esse tipo de reprodução pode ser observado em raias da família Arhynchobatidae e tubarões das famílias Heterodontidae, Scyliorhinidae e Orectolobidae. Dentre as espécies registradas neste guia, são ovíparas as raias Atlantoraja cyclophora, A. castelnaui e Rioraja agassizi.
Nos elasmobrânquios vivíparos, por sua vez, os embriões se desenvolvem dentro da mãe, porém, a nutrição pode ocorrer de diferentes formas. Na viviparidade lecitotrófica, observada em raias das famílias Rhinobatidae e Narcinidae, além do cação-anjo (Squatina sp.), tubarão-tigre (Galeocerdo cuvier), cação-bagre (Squalus sp.) e cação-sebastião (Mustelus canis), o embrião se nutre por meio do vitelo. Na viviparidade ovofágica, observada em Lamnidae, o embrião alimenta-se dos próprios ovos liberados pela mãe. Nesse modo de reprodução cabe destaque ao tubarão-mangona (Carcharhias taurus), que pratica “canibalismo” intra-uterino, ou seja, os embriões mais desenvolvidos consomem os menos desenvolvidos, nascendo normalmente dois filhotes, um em cada útero. Na viviparidade aplacentária (ou análogos placentários), os embriões se nutrem graças a estruturas denominadas de trofonemas, localizadas na parede interna do útero, sendo esse modo observado em raias das famílias Dasyatidae, Gymnuridae, Mobulidae, Myliobatidae e Rhinopteridae. Na viviparidade placentária, o embrião faz a nutrição pela placenta e essa condição pode ser observada nos tubarões da família Carcharhinidae, exceto Galeocerdo cuvier.
Além da reprodução, outra característica marcante nos elasmobrânquios é sua avançada capacidade sensorial. A visão e o olfato, por exemplo, são altamente especializados e desenvolvidos, permitindo a detecção de uma presa a grandes distâncias. A linha lateral, órgão sensorial presente também em outros peixes, é responsável pela detecção de estímulos mecânicos na água, especialmente vibrações. Além dela, esses animais contam também com estruturas interessantes na cabeça, chamadas de “Ampolas de Lorenzini”) e que os tornam capazes de detectar pequenos estímulos eletromagnéticos, inclusive de organismos (presas) enterrados.
Os complexos modos reprodutivos e os requintados sentidos concederam aos elasmobrânquios uma longa história evolutiva (mais de 400 milhões de anos), os quais rivalizam com os vertebrados mais derivados.